quarta-feira, 17 de outubro de 2007


SEXY AND THE JAMPA
Traduzido pela SBT como
Solteira* em João Pessoa
*mas eu prefiro chamar de mulheres possíveis
Episódio I(parte 2) de VIII
(em numeral romano que é chique!)
episódio de hoje:
NÚMEROS (parte final)
ainda faltando formatação, preguiça monstra!


Eu, Cronista do Cotidiano, alterego de sei lá quem, gosto de acreditar que sou filósofa, crio teorias já criadas e as faço minhas, vocês chamarão isso de plágio, eu prefiro dizer que na vida nada se cria e eu as transformo.
O que acontece com as decisões não tomadas?
Para mim, para muitos, gera um universo paralelo, o seu "sim" em algum outro lugar foi um "não" e o que aconteceu com esse "não"? Aqui você poderá dizer "sim" ao sorvete de morango, engordar 230g, sair da sorveteria encontrar o seu ex. e ele irá vê-la solitária num domingo 230g mais gorda, e ai? Mas no universo paralelo você disse "não", então, o que aconteceu? Você foi caminhar? Será que conheceu um jovem enfermeiro meio dentuço que te fez rir falando de lua, estrela, céu e mar, será que ele hoje acompanha teu dia e faz poesia? Será que num certo domingo você vai inventar de dizer "sim" ao sorvete de morango engordar os 230g e encontrar seu ex sozinhos num domingo e fazerem tudo errado? Não sei muito sobre experiências não vividas, não sei se os erros cometidos nesse universo serão repitidos no outro, mas sei que em algum momentos os universos se encontram, decisões ”sins” ou “nãos” te levarão ao mesmo lugar para viver justamente o inevitável e se você prestar bastante atenção poderá escutar um barulho leve um "Bum" ou ter uma sensação de repetição, chamada deja-vour. Nesse momento você entende que não há união sem destruição. Algumas experiências em outro universo serão recordadas e outras independente de qual universo prevaleça serão perdidas.
Os caminhos que escolhemos, os caminhos traçamos fazem quem somos, mesmo que não entendamos agora, erros serão repetidos até que possamos superá-los ou aprender o que temos que aprender, então, 230g sempre até que possamos DIZER NÃO a certas bocas unidas num certo pier com um certo alguém que não merece.

Em seu apartamento acompanhada por Brutus, o gato, Lilian esperava, esperava e esperava...
Deitada lia uma revista de moda, levantava, bebia vinho, calculava calorias de biscoito bono de chocolate, trocava sapatos, arrumara o guarda-roupas, examinava com uma régua a linear posição dos quadros.
21:00 - telefone não tocava...
Deu alguns toques para o telefone fixo do seu celular, ele estava pegando, pegou o telefone fixo e fez o inverso, o celular estava funcionando.
21:25 - telefone não tocava...
Procurou um ponto no apartamento onde o sinal do celular funcionasse melhor, esse ponto era atrás da perna esquerda do sofá de dois lugares.
22:00 - telefone não tocava...
Ligou o para o serviço de "hora certa" e acertou a hora de todos os relógios.
22:15 - telefone não tocava...
Checou os e-mails.
22:25 - telefone não tocava...
Maquiou-se, vestiu um vestido lilás, sapato prata e ficou examinando quando usaria aquele vestido.
22:45 - o telefone tocou.
"Lili?"
"Sim!"
"Não poderei encontrá-la, meu bem! Meu irmão arrumou dois ingressos para o jogo do flamengo e grêmio em Natal, estou a caminho de Natal, o jogo é amanhãs as 15horas, nos vemos outro dia, beijos!"
"Merda! Como assim? Não poderia ir amanhã? Ligar mais cedo? Se ele pensa que vou ficar em casa está enganado!!!", pegou o celular e discou meu número: "C.C., onde você está?"
"ESTOU NO G-14, POR QUE?", eu não estava ouvindo quase nada.
"Estou indo para ai! Com quem você está?"
"Marquei com o Davi, mas ele veio com a namorada e já foi!"
"Te vejo em dez minutos!"
Conhecendo a Lilian como conheço nunca que ela me veria em dez minutos, mas acreditei.

Quando ainda não falava inglês eu gostava de colocar letra na música, imaginar o que poderia ser dito naquele toque, era uma espécie de controle do desconhecido, você entender o latido do seu cachorro, ou para onde se foram as almas. Se não houver dúvida não haverá medo, a dúvida é o principio do medo. Eu sempre tive medo do desconhecido, medo do que não poderia entender, medo de gente mal encarada, de mar-alto, de pular de para-quedas, da casa vazia, das ruas escuras, da solidão. Então, minha mente me pregava peças, as vezes em casa era como se houvesse outra pessoa. Quando chegava colocava dois pratos na mesa e falava do meu dia, depois lavávamos os pratos, riamos, assistiamos televisão e eu ia dormir sozinha...
Não sei como isso começou, mas em mim nunca teve um fim.

Luiza batia os calcanhares pensando calorosamente “não há nada melhor que o nosso lar, não há nada melhor que o nosso lar, não há nada melhor que o nosso lar...”, um mantra, mas ela ainda estava ali? Com Doroth funcionava, mas ela ainda estava ali, e não havia melhor lugar que seu lar, "Cadê o Kansas?", se perguntou.
Para ela o lar era o seu castelo, onde a ela era a rainha e não qualquer mulher, mesmo que rainha de uma pilha de louça e calcinhas, ela era rainha de seus sonhos e naquelas quatro paredes eles estavam protegidos da destruição...
Mas estando em Roma sentia-se obrigada a agir como os Romanos, rir com eles, falar deles e girar em torno de seu mundo, mesmo que não estivesse em Roma, sentia-se lua orbitando ao redor de um planetinha egocentrico.
Tudo bem, ela não estava em Roma, estava num pedacinho do México em João Pessoa, um restaurante Mexicano no Bessa Shopping. O garçom atrapalhado mas parecia retirado de um livro infantil, um chapeleiro louco, falava português mas não conseguia entende-lo, talvez só ouvisse espanhol e repetisse: "Dois minutos, dentro de dois minutos"
“Achei que poderíamos experimentar algo novo”, falou “O Tal”, eu entendo assim: "Achei poderíamos experimentar algo novo, fora da cidade e onde nenhum conhecido poderá nos encontrar...".
“E eu achei que iríamos jantar!” tradução, "Odiei esse lugar!"
“E estamos!”, em suma, "E estamos jantando num lugar onde minha namorada não vai nos encontrar!", mas chega de traduções.
“Não sei se consigo vê isso como jantar... Só com muita imaginação, estamos comendo algo que não gostamos, diferente do que pedimos e bebendo uma espécie de água da privada com sal nas bordas...”
“Um pouco!”, ele riu, parecia ansioso, e algo nela se iluminará, talvez aquele sorriso tivesse estourado vaga-lumes em seu estômago, endorfina em seu cerebro, paz no seu espírito ou uma pequena parte dela reconhecerá que aquele sorriso lhe acompanharia eternamente.
“Queria saber se sua namorada aprecia seu sorriso como eu.”, PEM! PEM! PEM! Se você está saindo com um cara com namorada, a regra número um é não fale da mesma, deixe-a dormindo agarrada com uma foto dele, enquanto você ataca-o num bar mexicano fora da cidade, trazê-la para a cadeira na mesa, num encontro que já não está bom, não é legal.
“Poucas gostam de mim como sou, costumam me imaginar a seu bel prazer”, traduzindo (eu sei, eu disse que ia parar com isso!) "Não se iluda, que-ri-da!"
“Eu gosto do seu sorriso, ele eu não preciso imaginar, sei como é. É o melhor som que já ouvi, até agora, são as covinhas que se formam num canto, é esse dente levemente desproporcional, é a língua que encosta no serrilhado e finalmente estoura uma risada. Não é cantada é apenas o seu sorriso que me faz delirar!”, Regra número dois não se declare a um homem no primeiro encontro. Regra número três se você especialista nele, "O TALROLOGISTA" só a mãe dele, uma mulher desconhecida com tal diploma será facilmente reconhecida como piscopata, psicótica, desocupada, maníaca ou apaixonada, e um mandado de restrição no primeiro encontro é atestado de que nada deu certo, além de não ser romântico.
“Ou essa água de privada!”, e ele bebeu um copo cheio para se livrar.
As sirenes de que algo estava errado latejavam a cabeça de Luiza, o que estavam fazendo ali? Para ela tudo era tão simples que não conseguia explicar a ele. Numa manhã chuvosa “O Tal” aparecerá molhado, carregando uma valise de couro, o cigarro gotejando, cabelos despenteados e ela não conseguia lembrar se havia chorado ou era só a chuva que escorria pelo seu rosto destruindo a antes impecável maquiagem, talvez sua pressão estivesse baixa. O caso é que nunca tinha sentido tal coisa antes, divindo um espaço de dois metros e meio, talvez menos. E ela cheia de fantasias com elevador. Quando saíram daquele minúsculo espaço ela decidira que tratavasse de um encontro divino, para explicar sua promiscuidade, seu descuido ou sua espontaniedade, Deus estava gritando do alto de uma nuvem: “Luiza! Luiza, toma ai teu homem!”, eles tinham que ficar juntos.
Talvez o homem da sua vida não seja o cara que te faça diferente e sim o que te assim como é.
"Quem dera que fosse...", pensou.

Ana lutara contra todos os ingredientes (os ausentes e os presentes), contra o fogão, contra a cozinha, improvisara, e acabará indo assistir um cinema com o Bob e comer alguma coisa em qualquer restaurante da praça da alegria, resultado, sentia-se um fracasso. O homem fora a lua e ela não conseguia preparar um jantar, tinha sido derrotada em seu próprio território.
“Bobagem, minha mãe cozinhava, bordava...”, pausa para um ataque de pânico pessoal e intracraniano: “A mãe dele COZINHAAAAA, BOOOOOORDA E EU NÃO SEI FERVER ÁGUA...” , voltemos ao diálogo: “E quando meu pai morreu ficou perdida, nunca tinha ido ao banco, não sabia fazer a feira, não dirigia, nunca trabalhara fora de casa, sabia tocar piano, cozinhar, bordar, arrumava a casa impecavelmente, mas não sabia mais nada fora daquele universo particular. Amélia já está fora de moda, meu bem!”
Um pouco de delírio no “meu bem”, ele disse realmente “meu bem”?
“Mas eu queria ser Ana a programadora e saber cozinhar, chamar meus amigos e faze-los apreciar um jantar feito por mim, seria pedir demais?”
“Você é programadora?”, com um ar de espanto.
“Sim sou, faço software na área de segurança bancária. Mas sou também uma bruxa fracassada, incompleta! Tenho caldeirão, ingredientes, varinha e não faço magia. Não tenho coração de bruxa...”
“Você é uma programadora transforma números em vida e ainda diz que é uma bruxa incompleta? Você é a Hermione do banco de dados e nem todas são perfeitas, Ana. Você balança o nariz e faz vida. Eu faço música com a música, queria fazer música e ser poeta, mas dou vida a um salão, você não acha tudo isso mágico? Você faz muito mais do que magia de forno e fogão, Ana. Você dá vida, você é quase uma deusa num universo masculino...”
Em algum outro universo aquele jantar teria dado certo, Ana teria feito tudo e o Bob a essa hora estaria lhe dando uns amassos no sofá de casa, no entanto, eles estavam no Shopping Manaíra se vendo pela primeira vez e embora dormissem, naquela noite, em camas diferentes algo naquele jantar tinha dado certo.

Quando a Lili chegou eu estava deitada no balcão do G-14 vendo estrelas, não literalmente e não no bom sentido, eu tinha sido atingida por uma telha e sangrara até a morte que não chegou, mas eu sangrei muito o bastante para ser arrastada para um balcão no G-14, não suficiente para precisar de uma transfusão, mas o bastante para levar quatro pontos no hospital da UNIMED. Bem, mas como nenhum ridículo na minha acontece por acaso vou narrar o ocorrido com absoluta fidelidade.
Lilian pagou resmungando R$5,00 para entrar no G-14, quando entrou havia um tumulto envolta do balcão, pegou o celular e ligou para mim:
"Com quem falo?", um homem atendeu.
"Desculpe foi engano!"
Novamente discou o meu número e homem voltou a atender:
"Moça, escute! A dona do celular, está no balcão aqui e ela se machucou e... A gente não sabe quem ela é!"
"Ah meu Deus!"
Finalmente Lilian me encontrou com uma toalia ensopada de sangue na testa:
"Oi, sou a amiga dela o que houve?"
"Oi, eu sou Pedro, uma telha caiu na cabeça dela, ela desmaiou e eu estava levando-a para o hospital..."
"Ai meu Deus! Meu carro está longe, eu vou ligar para o SAMU e..."
"Meu carro está aqui ao lado, eu sou odontólogo e posso socorrê-la até o hospital..."
Nisso, antes que a Lilian dissesse que sim ou que não, ele já estava me carregando para o hospital:
"Ela tem plano de saúde, pode levá-la para a UNIMED!!!"
Corri muito?
Você deve está se perguntando como a telha foi parar na minha cabeça, não? E eu explicaria algo sobre maçãs e lei da gravidade, mas vou explicar com calma. Eu tinha acabado de desligar o telefone quando um Albino chegou para me paquerar. E era um albino mesmo desses que parecem mais um hamister gigante.
"Oi gata!"
Encarei Bob Dylan no banheiro masculino para vê se "a coisa branca" me esquecia: "Seja invisivel, seja azul, sou um banheiro, sou uma cadeira, eu não estou aqui... Apenas saia!" e quando ia saindo ele repetiu:
"Oi gata!", tarde demais.
Estranho ouvir um hamister gigante falando gata, ele deveria ter medo disso... Lamentei só ter aprendido palavrões no colégio, seria mais útil terem me ensinado a me livrar de albinos numa festa.
"Yo no hablo espanhol!", arrisquei...
"Do you speak english?"
"Eu sou muda, quer dizer... Surda!". Merda, pensa, albino gigante lhe olhando e... "Desculpe, tenho problemas mentais, minha mãe usou drogas e eu fiquei assim, sou mentirosa patológica, cleptomaniaca e um dia fui um menino problemático, mas esse último já está resolvido... Hoje só sou mentirosa e cleptomaniaca e... Só! Ah! Tenho dupla personalidade!"
E sai... "A coisa branca" me achou bem estranha, mas todo mundo acha. Algumas mulheres se apresentam como loiras, altas e olhos verdes, eu tenho cabelos vermelhos, olhos claros e sou estranha, além de baixinha...
“A rainha do nada e seu reinado é eterno...”, me virei e lá estava ele, cabelos cacheados e de uma tonalidade escura, olhos pretos, pele clara, alguns palmos mais alto do que eu, usava uma roupa atípica para os padrões de onde eu estava:
“O que você disse?”
“Não é sempre que se encontra uma rainha, majestade. Então, temos que soltar uma frase de impacto para que possamos assusta-la. Confundir e impressionar, entendeu?”
Sacudi a cabeça e fiquei olhando para ele, lembrava o Tom Hanks naquele filme DESPEDIDA DE SOLTEIRO.
“Rainha do que?”
“Do nada e seu reinado é eterno!”
“Ótimo!”, sempre admirei essa minha capacidade de atrair bêbados, loucos e palhaços, três figuras que me irritam.
“Meu nome é Daniel, qual seu nome?”
Estávamos conversando bem próximos devido ao barulho do som, acho que foi justamente nesse momento que a telha caiu em minha cabeça, pois não me lembro se disse ou não meu nome.
Nessas horas sempre aparece a figura do heroica, um desconhecido (muitas vezes) que te carrega nos braços nem perguntar se esse era o lugar de outro, ou não.
Quando acordei o herói estava segurando a toalia na minha testa e usando meu celular, quem disse que eu queria ser salva?
Lilian chegou perto de mim e começou a falar coisas sem sentido.
Depois disso estava no carro com o herói dirigindo, Daniel ao meu lado no banco do carona e onde estava Lilian?
"Cadê a Lilian?", perguntei a Daniel.
"Sua amiga?! Ela veio seguindo a gente...", o herói respondeu. "Sente-se bem?"
"Tonta, quem é ele?", me virei para Daniel.
"Eu sou Pedro, sou odontólogo, estávamos preocupados com você... Qual seu nome"
"Me de CC, é um apelido...", olhei para Daniel e disse: "Você viu o que me acertou?"
"Uma telha, continue segurando a toalia, CC significa o que?"
"Minha amiga, cadê?"
"Ela vem nos seguindo, acalme-se! Sabe, isso pode dá um processo..."
"Ele deve ser advogado, daqui a pouco lhe dará o cartão!", Daniel sussurrou no meu ouvido.
"Você é o que?", perguntei
"Sou odontólogo, acho que já disse! E você?", ele pegou o celular e discou alguns números: "Ricardo, aqui é o Pedro, você está no hospital? É que estou com uma "amiga" e caiu uma telha em sua cabeça, ela está sangrando e acho que está com um leve desnorteamento, perda de memória, não sei..."
"Estou bem, só quero..."
Novamente acordei cercada de gente que me encaminhava para uma tomográfia, no final da longa sessão eu estava bem tinha sido apenas o susto e alguns pontos.
"Nossa, Pedro, foi uma sorte você está lá para socorrê-la, por favor, mande a conta da limpeza do carro que faremos questão de pagar."
"Não precisa, faço questão de escoltá-las até em casa e, por favor, não a deixe dormir..."
"Passarei a noite com ela, Dr. Ricardo, falta pouco para acabar seu plantão?"
"Faltam algumas horas!"
"Seu apartamento está limpo, CC?"
"O que?", perguntei.
"Seu apartamento está limpo?"
"Que dia é hoje?", estava levemente dopada parecia que a vida passava em slow.
"Sábado!"
"Está!"
"Então, Dr. Ricardo, sei que é pedir demais, mas você poderia nos acompanhar, farei um lanche e conversamos...", Lilian sorriu.
"Claro, vamos os quatro, será ótimo!", Pedro tomou a dianteira e eu não acreditava que meu acidente tinha virado um encontro a cinco.
"Vamos os cinco?", corrigi.
"Cinco?!", Lilian perguntou.
"Dr. Ricardo, eu, você, Dr. Pedro e o Daniel?"
"Quem?", Lilian perguntou.
"Você estava acompanhada?", Pedro perguntou.
De repente tudo parecia estranho, como se fosse um delírio e preferi ficar calada até colocar a cabeça em ordem. No fundo, dizer que havia alguém que ninguém mais vira era muito estranho e poderiam querer me levar dali para o Juliano.

Conversar com estranhos sempre foi muito difícil para mim, acho que é por isso que me tornei escritora, me esconder atrás de uma folha é bem mais fácil do que o horripilante face a face. Eu sempre acabo falando de feridas, alienígena, revistas em quadrinho ou qualquer outra coisa mais estranha como probabilidades de um raio cair em sua cabeça, maçaneta de banheiro e as chances de você trocar inditetamente na genitália de alguém, fantasmas seres incompreendidos ou qualquer coisa mais louca que venha a minha cabeça. É difícil ser eu mesma, por saber que todos me estranham a primeira vista e mais ainda difícil ainda ser outra pessoa, não sou uma boa atriz. Sempre senti um pouco de inveja dessas pessoas que conseguem falar com estranhos, da gargalhadas, falar sobre tudo, eu não era/sou assim.
Lílian e Dr. Ricardo estavam na cozinha preparando sanduíches:
“Eu preparo maioneses temperadas maravilhosas!”
“Temperadas?”
“Sim: galinha caipira, cenoura, azeitona, limão, cebola, queijo... Quando tiro o domingo para fazer isso todo mundo chega com um pote, pena que dura pouco...”, suspirou.
“Eu sou ótimo de garfo e minha mãe é uma excelente cozinheira, faz doces, compotas, coisas sofisticadas e outras coisas mais simples...”, sinceramente, detesto homens que tocam no assunto mãe no primeiro encontro, para mim a melhor sogra é aquela que mora longe o bastante para não vir de chinelo e perto o suficiente para não precisar de mala.
“Minha mãe nunca cozinhou nada, fazia omeletes de salsicha, batata frita e arroz para acompanhar, engraçado, o arroz dela era tão soltinho que ela sempre dizia que cozinhava um a um, esse era nosso almoço de domingo e até hoje eu nunca comi nada melhor...”
“Eu adoro omelete!”
“Faço um com bacon perfeito! Quer?”
“A CC não se importa?”
“Ela não sabe onde fica nem a geladeira, vamos ter que sair para comprar os ingredientes...”
Na sala eu e Pedro ensaiávamos sem sucesso algum assunto, minha cabeça latejava de dor e meus pensamentos estavam no rapaz misterioso. Pedro levantou-se e foi até o som:
“Se não se importa colocarei uma música, vamos vê o que está na agulha! Dizem que a última música que ouviu fala muito de você.”
“Isso e os livros que lê, o seu lixo, suas roupas, seus amigos, o que você come e seu apartamento... Tudo fala por você, menos você... Tomara que eu tenha ótimos agentes publicitários e bons advogados... Mas o CD 1 é Rita Lee! Ela me inspira...”
“Jura?”, no som agora tocava doce vampiro, música que eu achava muito sensual. “Prefiro os lobisomens...”
“O que? Você prefere um lobisomem a um vampiro? Qual é? O lobisomem nem pensar pensa, ele age por instinto é muito mais animal que um vampiro, além disso não há lobisomens famosos...”
“Como não? E aquele lobisomen de “The Monster Shared”? Cara que filme!”
“Você lembra desse filme?”
“Não consigo esquece-lo! Outro dia estava no interior, numa dessas festas de São João, e no lugar de curtir a festa fiquei assistindo ao filme, acredita?”
“Sério!? Nossa, pensei que só eu tinha essas crises nostálgicas, que legal!”
“Eu sou nostálgico! Mas voltando ao assunto, os lobisomens são mais misteriosos, talvez o mestre lobisomem ainda viva escondido... Eles tem uma vida mais normal que a dos vampiros, ficam apenas febris durante a lua cheia... Eles fedem, cheira a sangue, suor, pelo, roupa rasgada, boca salivando e fora a dor de dobrar de tamanho, brotar pelos de onde antes não tinha, ter a sua estrutura óssea reconstruída para criar um focinho... Como disse, os vampiros pálidos, cabelo arrumadinho, roupas escuras e lambidas, com dentes e medo do Sol, são gays! As mulheres vampiras são gatas, gostosas, tem aquele ar doente, romântico, bulcólico... Mas para homens não combina, muito EMO e fim!”
“Doutor que preconceito!”
“É minha opinião, não gosto de vampiros, colocaria um aparelho dentário neles e fim!”, dei uma gargalhada, esse era o tipo de comentário que esperava de um dentista.
Lílian e Dr. Ricardo voltaram informando que fariam omelete.
“Nunca havia caído uma telha na minha cabeça...”
“Jura? Isso é tão comum, um dos acidentes mais comuns que podem acontecer com um ser humano, o outro, acidente mais comum, é os motoqueiros que levam bicada de passarinho na testa, eles passam por revoada de passarinhos e PIMBA, ai minha testa!”
“Sério?”
“Sério!”, ele deu uma risada: “Mosquito nos dentes e passarinhos na testa são os grandes problemas dos motoqueiros, maiores que motoristas desavisados abrindo a porta ou decapitação por linha de pipa...”
“Você está rindo de mim?”
“Um pouco disso, um pouco daquilo...”
“Notei! Mas esse acidente com telhas pode ser comum na construção civil, não sei...”, ele ficou calado me olhando, não tinha reparado mas seus olhos eram bem claros, quase azuis.
“Mas você não estava na construção civil, você estava numa boate no centro histórico e uma telha caiu na sua cabeça, sorte que não foi algo mais grave... Engraçado, estava indo conversar com você quando tudo aconteceu...”
“Você costuma bancar o herói sempre?”
“É a graça de ser dentista, não somos muito heróicos, sabe... Não saímos fazendo obturação com cimento e clipe, ou extração com cadarço e água quente... Só podemos colocar toalia na cabeça de uma donzela semi-decapitada...”
“Verdade quase perdi a cabeça...”, ironizei.
“Mas perderá, pode deixar que estou planejando!”
“Pretende me matar?”
“Quem sabe?”
Ainda pensei num comentário inteligente para dizer agora, mas não consegui pensar em mais nada.

Todo mundo tem uma história para contar, basta ter, pelo menos, um ouvinte meio surdo para ouvir. As vezes nem é necessário que haja um ouvinte, basta que haja uma história. Edson era um cara amigável, desses que há aos montes soltos por uma cidade como João Pessoa, mas é provavel que você não o encontre solteiro, ele estará com uma garota que não merece, sendo desconsiderado e nada amado, para azar seu e dele.
Engenheiro, simpático, bom ouvinte, engraçado, amigo, companheiro e de um certo modo, sexy... Era o tipo de cara que você liga no meio da noite para contar do seu encontro, fracassado ou não e se ele não tomar cuidado se tornarão eternos amigos. A primeira vez que a Ana falou de Edson usou essa frase:
“É o tipo do cara que possui trilha-sonora própria...”, no inicio não entendi, imaginei um cara que quando chegava cantava um TANANAN ou saia cantarolando aqueles toques de celular. Desculpem, o mais próximo que cheguei da música clássica foram os toques de celular e, para mim, o NOKIA-SONG é um deles. Mas não, o Edson é gentil e aos poucos comecei a perceber músicas nele. O interessante é que ele entrou no nosso convívio como o namorado da Ana, eles namoraram três meses e no final a Lílian e o Edson se tornaram amigos. Estranho?! Também achei... Ninguém sabe ao certo como tudo isso começou, saíamos em cinco e de repente a Lílian tornou-se vela, depois ficaram amigos no MSN e quando terminou o namoro, o Edson foi se abrir com a Lílian. Ai surgiram cinemas, saídas a noite, conselhos e de repente:
“Gente! Eu e o Edson somos amigos!”, ela falou num tom de culpa, como quem revela que assiste novelas da SBT ou voltou ao alcoolismo, você imaginou nossa cara de surpresa? Não, não houve. Nós três já sabíamos que eles eram amigos, ela é que não queria assumir por causa da Ana, que nunca foi realmente apaixonada pelo Edson e estava pouco se lichando com quem ele manteria uma amizade pós-Ana. Na verdade, em relação a essas coisas a Lílian sempre foi muito devagar.
No dia seguinte ao nosso encontro inesperado encontro a quatro, Edson e Lílian combinaram de passear na praia para conversar, ele parecia um pouco ansioso e ela esperava o telefonema do Dr. Ricardo.
“Nossa, ele comeu e lambeu os dedos, acredita?”
“Imagino...”
“E é bonito, é médico, é simpático, gostoso, sexy...”
“Uau!”
“Não sei, mas acho que se ele me ligar a gente vai acabar namorando...”
“Ah!”
“Como você está?”
“Bem!”, eu acabei não contando, mas depois de um tempo, ou desde o inicio, o Edson acabou alimento uma paixão pela Lílian e sobre a trilha-sonora a que me refiro agora é “Por que não eu...?”, você pode imaginar o que quero dizer? É simples, só é você imaginar todos os dias outra pessoa satisfazendo a pessoa que você ama, outra pessoa! É só você imaginar satisfazer-se com as migalhas da atenção, “se não tem nada para depois, por que não?”, fazer declarações mentais diárias... Entendeu qual a situação do Edson? Quero dizer, a situação do Edson era péssima. Se a intenção inicial dele era faze-la se apaixonar por ele, esta já estava fracassada, pois ele se tornará o melhor amigo dela e passavam horas falando de cada pretendente dela e ele não conseguia esquece-la... E um cara tão exato, divertido, que tinha tudo para ser o príncipe tornara-se apenas o fiel escudeiro, perto demais para roçar o braço, distante o bastante para não tocar o coração.
Saber aonde ele havia errado?
Quando foi que errou no destino, “ainda encontro a formula do amor!”
Ele respirou fundo e disse algo, talvez esperasse que isso a afetasse de algum jeito:
“Eu conheci alguém!”
“Que bom!”, ele deu um beijo em sua bochecha e continuou caminhando.
“É uma garota legal, bem mais nova, universitária, divertida... Me parece que pode dá certo...”, era possível sentir um misto de insegurança e esperança em sua voz, “goste de mim, metade, da metade do que gosto de você”, um apelo pelo sentimento daquela mulher. Não que Lílian fosse baixa, ao contrário, tinha 1,70 depois de Luiza era a mais alta da nossa turma, mas perto de Edson com seus 1,95 ela se tornará uma formiga, e ele se sentia mais ridículo por ter uma mulher 25cm mais baixa que ele espetando seu coração com um salt0-agulha e totalmente dona de suas emoções.
“Dará! Você fará dá certo, quem sabe não é um novo passo na nossa vida...”
Ele passará a tarde ensaiando o fim dos encontros com Lílian, escreveu um script que encontrava-se em seu bolso e o sabia de có:
“Lili, tenho algo a lhe dizer!”
“O que?”
“Estou apaixonado! Ela é inteligente, bonita, simpática... Estou apaixonado e quero que dê certo!”
“Não posso negar que estou com ciúme, Ed!”
“Não tenha, o espaço que você ocupa em meu coração é único, mas meu coração precisa de um novo caminho...”
“Então siga-o, Ed!”
“Lili, talvez você tenha que ficar no caminho, não conseguirei amar ninguém com sua sombra em minha vida, nossos caminhos terão que se separar...”
Como uma boa novela global o script do Edson também tinha dois finais, no primeiro Lílian pulava em seus braços e dizia: “Não posso suportar, Ed. Não posso imaginar minha vida sem você, por favor, não me deixe... Agora vejo tudo, EU TE AMO!” e no outro começava a chover e com os olhos mareados Lílian tomava uma grande decisão: “Siga seu caminho, Ed, nem que para isso eu tenha que ficar no caminho!”


Os dias que se passaram foram planos para o que fazer num dos piores dias do ano para os solteiros: O DIA DOS NAMORADOS. Só perdendo para o NATAL com todos aqueles casais falando de noivado e você solteira ouvindo todos perguntando quando você vai desencalhar.
EU NÃO ESTOU ENCALHADA!!! Estou vendo as opções!”
“EU NÃO ESTOU ENCALHADA!!! Estou estudando possibilidades!”
“EU NÃO ESTOU ENCALHADA!!! Quero ficar sozinha!”
“EU NÃO ESTOU ENCALHADA!!! Algumas nasceram para ser mães, eu nasci para ser filha. Não tenho vocação para ser mãe de filho, mãe de casa e mãe de marido!”
“EU NÃO ESTOU ENCALHADA sou moderna!!!”
“De toda forma, querida, não esqueça que o tempo passa e que é seu pé que estará todas as noites frio...”
Enfim, todas as festas de família, não vou me prolongar.
Mas voltando ao dia dos namorados, maldito!
As lojas anunciavam tal dia como a ocasião do ano (tudo para vender, romance, amor...), cheias de corações e bandeirinhas de São João, pelúcias, chocolates e celular, algumas ofereciam vale-presente goela abaixo para quem não gosta de errar e não tem nenhum senso poético ou romantismo, outras ofereciam presentes diversificados e eu com pontos na cabeça reclamava a todos a morte do meu peixe. Ana e eu tínhamos ido procurar uma lembrancinha de última hora, para ela dar ao Bob, não que eles estivessem namorando, mas Ana sentia que se não comprasse algo seria uma grande garfe, visto que, ele a chamará para um jantar exatamente no DIA DOS NAMORADOS. Mas Daniel não saia de minha cabeça. Talvez pelo fato de ninguém ter notado sua presença ou, realmente, ela não existia.
"Você quer dizer que ninguém viu esse cara?"
"Quero!"
"Não pode ser fruto da sua imaginação?"
"Pode!", respondi.
"Não duvido que seja, não recomendo que comece com isso outra vez, se não existe não te toca, se não te toca não há calor, sem calor... Só são palavras... E palavras suas, me parece tão simples..."
"Mas e se não for?"
"Se não for ele vai aparecer, esse Pedro pode não ter prestado atenção e a Lilian pode não tê-lo visto, só isso..."
"Não é provável, né?"
"Não, não é. Sua cabeça está pregando peças com você, mas relaxe, isso passa..."
"Não conta a ninguém, tá?"
"Alguma vez contei? Mas sabe o que eu acho, dê uma chance para você, não crie fantasmas ou se iluda com o que não existe..."
Fiquei pensando que o Daniel poderia ser fruto da imaginação ou encontro de universos paralelos por algum tempo, em outro universo eu teria voltado para casa com ele e não com o Pedro.
Embora a noite do encontro a quatro após meu acidente fora divertida, também fora longa, eu meio dopada falava sobre tanta coisa e Pedro se mostrará uma companhia divertida,mas uma figura desconhecida me chamando de rainha conseguira superar qualquer companhia heróica e relativamente agradável. Dr. Ricardo ainda não havia ligado para a Dra. Lílian.

Já Luiza se esquivara com sucesso de todos os encontros com "O Tal" evitar vê-lo durante o resto da sua vida era uma missão impossível, mas era o plano:
“Você sabe que isso é impossível, né? Vocês trabalham na mesma empresa, vocês moram na mesma cidade, provável que façam compra no LATORRE... As chances de encontra-lo são enorme...”
“Eu sei, mas eu vou andar com chapéu, óculos, casaco... E ainda posso sair correndo, me baixar... Me esconder... Sou capaz!”
“Eu não quero sair de perto de você nunca, Lú. Quero acompanhar todas as noites que você sairá do elevador de chapéu, óculos escuro, casaco comprido, as vezes que sairá correndo no shopping quando encontra-lo... Nossa vida será uma comédia!”
“Vou sair a francesa, vou me baixar... Será simples! Não quero mais vê-lo e fim!”
“Vou procurar um emprego para você na filial em Recife e tudo estará resolvido!”
As duas estavam na sala de Luiza quando um rapaz de macacão azul interrompeu a conversa:
“Bom dia! Eu tenho essa encomenda para a Srta. Luiza!”, era uma cesta com flores e um urso de porte médio.
Luiza abriu a boca e estendeu as mãos, Lílian pegou o cartão e começou a lê-lo:

“Luiza, você é a orquídea negra que brotou da máquina selvagem, e o anjo do impossível plantou como nova paisagem. Você é a dor do dia a dia, você é a dor da noite à noite, você é a flor da agonia, a chibata, o chicote e o açoite... Te pego para almoçar, te levo para jantar, assistiremos a um filme e depois te colocarei na cama...
João Antônio”

"Orquídea negra... O que ele quis dizer com isso... Quem é esse cara?", Lilian colocou o bilhete na mesa.
"Um admirador?"
"Parece!"
"É parece!"
Luiza e Lilian ficaram esperando na sala de Luiza até as duas da tarde, quando perceberam que ainda não tinham almoçado e passara a hora do almoço:
“Você conhece algum João Antônio? Poderíamos fazer uma lista de prováveis João Antônio”, Luiza, meio tímida, perguntou para Lílian.
Lílian pegou um papel e falou:
“Para todas as possibilidades estamos em reunião, certo?”
“Vamos lá! Tem o João Antônio da xérox...”
“João Antônio da xérox!”, Lílian anotou no papel. “Aquele nem pensar, ele é horrível! Estrábico, gordo, careca, tem hidrofilia e fora isso acho que ele usa chapa!”
“Não, não usa.... Não há chapas dentuça!”
“Tem outro?”
“Huuuuuuuum, não que eu me lembre!”
“Onde está sua lista de persona non grata?
"Aquela tem o nome de "O Tal"?”, Luiza ironizou.
“Sim!”
“Não fiz uma lista com um único e pseudonome, Lílian! Não esquecerei que terei que evitá-lo...”
“Bem, então eu vou acrescentar o nome de "O Tal" nessa lista e em cima vou colocar “Pessoas que a Luiza irá evitar FOREVER”, pronto, agora você tem duas pessoas que tem que evitar! Sua vida será bem mais emocionante...”
“Acho melhor eu ir conversar com ele sobre essas flores, não quero jantar, almoçar e ir ao cinema com ele...”
“Muito menos que ele lhe bote na cama!"
"Não queria essa imagem na minha cabeça, Lili..."
"Ela já está na minha e imagino ele em cima de você o suor caindo em litros e você se afogando!"
"Eu vou agora falar com ele!", levantou-se num pulo.
"Melhor, senão ele vem lhe buscar a noite e eu estarei aqui para rir de você ou jogar arroz no casamento!”
“Que bom humor é esse?”
“Nada, apenas estou me divertindo a suas custas...”
“O Dr. Rich ligou?”
“Não, mas encontrei com o Ed e ele está namorando...”
“Você?”
“Eu ainda estou solteira, Luiza!”
“Ah! Pensei que você tinha percebido algo que todos notamos...”
“Eu acredito em amizade heterossexuais! Vamos ao duende?”
“Você acredita neles também?”
“O baixinho orelhudo da xérox, seu admirador e futuro marido!”
Luiza entrará e sairá em alguns minutos pálida ainda segurando as flores e o ursinho:
"Não é ele! Mas antes que eu falasse que achava que era ele, ele cogitou que o presente era para ele, ai não acredito... Ele me abraçou!", falou sem olhar para o lado e subiram para a sala de Luiza.
"Então...", Lilian pegou na mão de Luiza.
"Então, ele pode ter mentido e me abraçou, pode ser um trote e ele me abraçou ou eu posso ter realmente um admirador e o gnomo da xerox me abraçou..."
“E te abalou!”
“Sem trocadilhos...”
“Mas você foi abraçada e dá para sentir o cheiro...”

As quintas eu costumava ir ao centro, apesar de odiá-lo, entregar minha coluna para o jornal do domingo, poderia fazer por e-mail, mas gostava do prazer de entrega-la em mãos, original e disket, sou uma moça a moda antiga, nem uso pen-drive e ainda tenho alguns vinis escondidos no armário:
“Ei! Espera! Espera!",Daniel surgira com uma gravata e uma pasta de couro correndo atrás de mim feito louco, "Você está bem?” e lá está ele um leve sósia do Tom Hanks.
“Estou, levei uns pontos e... Para onde você foi?”
“Naquela hora?”
“Achei que tinha delirado com você.”
“Um pouco!”
“Então, acho que tenho que te ignorar a partir de agora...”
“Por que?”
“Se você foi delírio eu não quero embarcar nisso, desculpa!”
“Se eu fui não quer dizer que sou!”
“Se você é, eu quero que saia, suma!”
“Não é assim que funciona e se você me inventou? E se eu não sou real? Não quer dizer que depois de inventado eu não tenha adquirido personalidade e me tornado, de certa forma, real!”
“Não, se não posso te ver, te tocar... Você não é real!”
“Então... O ar...”
“O ar existe e não depende de mim para existir, eu não inventei o ar!”
“E eu? Eu não posso ter saído da sua imaginação e tomado vida?”
“Não quero brincar disso, só isso... Não tenho idade para ter um amigo imaginário...”
“O que custa acreditar que eu existo? Medo de se apaixonar?”
“Não, não é medo de nada... Custa que eu não posso fazer isso comigo, então suma!”
“Se entregar a uma louca paixão? Me conhecer melhor? O pior que pode acontecer é não dá certo e seguirmos caminhos opostos...Vamos a praia mais tarde?”
“Estou tão cansada disso...”
“Da praia? Que tal cinema? Poderíamos conversar, eu lhe contar tudo que eu sei de você!”
“Você sabe o que eu sei, eu lhe inventei!”
Ele deu uma risada e pôs o braço sobre meu ombro:
“Não é verdade, como lhe disse você é a rainha do nada e seu reinado é eterno, você é a última de sua linhagem, tem olhos que guardam uma galáxia e isso não é metáfora, você é a chave do Portal, o elo em comum de todas as galáxias, universos, mundos e esse é seu direito de nascença, ninguém tira, não há talismã que guarde... Quando você fica triste o mundo escurece e chove, ninguém consegue explicar mas isso é real... Então, você sabia disso?”
“Não, mas poderia ter imagino. Você não é real!”, levei as mãos ao ouvido e fiquei cantarolando um LALALALA
“Eu posso ser do futuro!”
“Daniel, você agora é passado, suma!”
“Não me queira longe, rainha! Eu existo...”
“Adeus!”
Entrei no jornal e tentei deixa-lo fora dos meus pensamentos.
Ele não é real!
Ele não é real!
E minha cabeça doía, fiquei pensando que se ele existir deve me achar estranha ou louca, se ele não existir as pessoas devem me achar louca e estranha.

As quintas também costumávamos almoçar juntas, aproveitávamos que a Ana tinha um intervalo prolongado, Lílian e Luiza se dirigiam a lagoa e nos reuníamos para almoçar no Cassino da Lagoa, os pratos eram enormes, costumava dizer que tratavam ser de Elegantes Pratos de Pedreiro e não deixava de ser verdade, dois já bastavam para as quatro.
O dia dos namorados tinha passado relativamente calmo, Ana e Bob estavam namorando. Eu ainda me perguntando se aquele encontro com Daniel tinha sido real ou não, talvez somente a figura que conversará comigo era real ou nenhuma e fim.
Lilian e Luiza entraram num tititi sem fim.
Finalmente estávamos as quatro reunidas:
"Eu já entendi que odeio o dia dos namorados, não porque estou só, mas porque nesses dias tudo fica mais complicado na minha vida, no fundo, é porque estou só e fim, vou deixar de pseudo-conformidade, eu não quero estar só! Quero um namorado!!!", Luiza desabafou. "Vocês acreditam que eu levei um bolo?"
Lilian deu uma gargalhada.
"O Tal?", Ana perguntou. "Antes que você conte, eu e o Bob saímos para jantar e ele me pediu em namoro..."
"Pediu em namoro? Quantos anos vocês têm 13?”, Lílian deu uma gargalhada.
“Sabe, se uma mulher como a Luiza leva um bolo de um admirador secreto o que eu posso esperar de mim?", me revoltei.
"Ele não era meu admirador!"
"Não, não era!", Lilian deu outra gargalhada.
"Afinal, o que houve?", Ana - a namoradeira - perguntou.
"Eu fiquei esperando até oito da noite pelo cara, o tal João Antônio."
"Foi?"
“Mas antes disso foi abraçada por um gnomo, acrescente, eu adoro essa parte!”, Lílian olhando o cardápio.
"Calma! Não quero falar do gnomo da xérox, chega de traumas, se relembrar vou virar lésbica e vou ter que me frustrar porque nem as mulheres irão me querer...”
“Se, um dia, eu virar lésbica e você for, saiba que eu não estaria desinteressada...”, tentei anima-la.
Luiza me olhou com a boca aberta, ela sempre se surpreende com pouco.
“Anyway... Voltando ao assunto, ele não apareceu, fui para casa reclamei, reclamei e reclamei, falei a Deus tudo que pensava, mas acho que ele só ouve quando reclamo em alemão!!! Ai pensei que ele poderia ter sido atropelado e tudo fez sentido. Hoje comprei o jornal para vê se tinha algum obituária de algum João Antônio, porque se fosse piada seria uma piada cruel. Mas ele apareceu, não morto e não no jornal... Ao Vivo ele é lindo...”
“Viva!”, Ana levantou os braços.
“Posso terminar? Ele é loiro, usa óculos, tipo um príncipe, fala com chiado e é um sonho... Como disse, Deus só escuta quando falo alemão, mas meu alemão só vai até o básico dois! Ai vem a merda, o fudeu e as drogas! Há uma Luiza na vida dele e não sou eu, as flores tinham sido um engano, eram para ela e ele chegou todo gentil. Se apresentou e meu coração dava para ouvir lá da entrada... E disse que eu poderia ficar com as flores, com tudo! Mas eram para a namorada dele... Deus, onde está você? Ele disse que namorava Luiza do departamento pessoal, a contadora, e na floricultura houve um engano e mandaram para mim e no final ele disse que a Luiza ficou louca, não sabiam que eles tinham marcado de almoçar e foi almoçar com um amigo e não atendeu ligações dele porque ele esqueceu o presente, quando ele a encontrou não sabia que ela não tinha recebido e pagou o cinema e o jantar, depois ela estourou, ele se justificou e ela não acreditou... Mas ainda bem que ele me achou, disse que algo tinha feito as flores chegarem até a mim e eu torci que fosse uma cantada e que ele me chamasse para sair, mas quais as chances de isso acontecer? Como bom advogado ele pediu para que eu assinasse um papel contando o que houve e tirou umas fotos minha com tudo que ele me deu no celular. Me senti ridícula, feia, mal amada... Não tinha um único namorado que pudesse dizer que ficou com ciúme, droga! Foi horrível, flores, engano, homem lindo e eu sozinha chupando o dedo... Como pode?"
“O que?”, Ana perguntou.
“Somos solteiras, inteligente, relativamente bem sucedidas, mas não somos independentes precisamos de alguém, sempre! Droga! Queria não precisar de uma alma-gêmea, de não querer tanto um relacionamento quanto eu quero...”
Ana se sentiu feliz por não se enquadrar no grupo que nos encontrávamos e quando chegasse em casa iria ligar para o Bob dizendo o quanto gostava dele.
Lilian ficou com uma certa dó da Luiza, aquilo das flores havia afetado seu balé, ela parecia bem perturbada.
Eu fiquei pensando que no jogo do amor ser feia ou bonita conta no placar inicial, mas não são esses atributos que definem se seu time irá ou não vencer o jogo, há mais coisa.
Em todo o caso, se me pedissem para acreditar em algo, eu acreditaria no inacreditável, no improvável e nunca aceitaria a vida como ela é. Acreditaria que nessa busca incansável embora o placar não esteja favorável as coisas darão certo, os príncipes aparecerão e o dia dos namorados como esse, onde três ficaram sozinhas e uma ficou acompanhada seria o último. Acreditaria que o Ricardo ainda vai ligar, que o Bob e a Ana darão certo, que o verdadeiro João Antônio ou "O Tal" ainda está par aparecer, com flores, ursinhos, conchas e mar e que o Daniel existe, porque nos momentos que é difícil ser otimista que devemos ser mais otimistas. Acreditaria que mesmo que não fossem Daniel, Ricardo, Robert ou João Antônio, que havia alguém para alguém, um para nós, ninguém para ninguém ou todos para alguém.
Acreditaria que não é preciso haver um universo paralelo para as coisas funcionassem de um jeito satisfatório.

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